27/07/2015

Maurizio Lattanzio - O Comunismo Aristocrático

por Maurizio Lattanzio



Uma organização social, econômica e financeira deve, em primeiro lugar, se conformar a um princípio essencial: o elemento econômico (vinculado à ordem dos meios, caracterizado, pois, por sua instrumentalidade) deve estar subordinado ao princípio político (vinculado à ordem dos fins).

Assentada esta premissa, resulta necessário em seguida delinear as linhas essenciais e as articulações estruturais próprias da organização econômica e social do Estado.

Pudera parecer estranho que, no mesmo momento em que nos enfrentamos à exigência primordial de garantir a sobrevivência de nossa espécie, se desça à delineação de modelos organizativos econômico-sociais.

Perante isso, consideramos necessário fortalecer e difundir em sua totalidade o espectro teórico que reúne e expressa nossa alteridade racial, com o objetivo, pelo menos, de transmitir instrumentos político-culturais corrosivos e devastadores àqueles Camaradas que nos sigam e continuem nossa luta, perpetuando a ontologia da comunidade do povo na qual nos reconhecemos. Porém, algo talvez mais importante hoje, resulta igualmente necessário assinalar aqueles horizontes que, prescindindo da mais ou menos imediata atualidade prática, contribuam a romper, a separar as raízes enfermas através das quais flui o reflexo condicionado que, consciente ou inconscientemente, pode todavia nos induzir a dar ouvidos aos ecos de expressões que foram e são da direita.

O modelo organizativo que determinaremos e que tentaremos acima de tudo argumentar em suas possibilidades tradicionais, possui assim uma considerável eficácia "provocadora" político-psicologicamente, ainda que sem diminuir minimamente sua rigorosa conformidade com a cultura da tradição.

A organização estatal se configura como Estado popular, forma de comunismo aristocrático de tipo espartano e de inspiração platônica, caracterizado pela abolição da propriedade em qualquer de suas formas de manifestação.

Em nenhum caso se deve confundir a organização comunista da esfera econômica com o socialismo marxista, cujas proposições podem, por sua vez, se desenvolver inclusive no marco de uma sociedade que não seja integralmente ou estruturalmente comunista.

Habitualmente, o termo "comunismo" faz referência a ideologias que afirmam concepções fundadas sobre a estatização do ciclo produção-consumo; a terra, os meios de produção são propriedades do Estado e posse do povo que os utiliza segundo objetivos fixados pelas autoridades centrais, mediante o uso instrumental da planificação das necessidades e dos benefícios.

Hoje, o termo comunismo está associado automaticamente à ideologia marxista como sua consequência necessária sob o aspecto sócio-econômico. Há uma espécie de reflexo condicionado que induz a considerar o regime comunista da propriedade e do direito como monopólio exclusivo do marxismo. Semelhante reflexo resulta sem dúvida alguma estimulado pela incontestável relevância assumida pela ideologia marxista, que, ademais, aplicou de fato este esquema social e econômico no transcurso de seu desenvolvimento histórico-político durante o século XX. Mas isto não deve nos levar a erro: é bom saber que elaborações teóricas e aplicações práticas de caráter comunista remontam a épocas muito anteriores ao nascimento do socialismo marxista. (1)

À margem do regime comunista vigente na Esparta dórica, há que recordar especialmente o "comunismo platônico" teorizado precisamente por Platão na "República".

Na "República" de Platão, o regime comunista é ademais um privilégio que corresponde - em harmonia com sua função suprema - aos guardiões (fylakes), quer dizer, aos dois primeiros estamentos formados pelos sábios e pelos guerreiros, com estrita exclusão dos artesãos e dos camponeses. O regime comunista correspondente aos guardiões não se refere somente à propriedade, senão se estende também às famílias, com o fim de cimentar a absoluta coerência ética e por outra parte o absorvente serviço ao bem comum dos membros do corpo aristocrático. As relações entre jovens e velhos - cada um dos quais podia ser respectivamente o filho ou o pai do outro - ficarão estabelecidas sob um sólido tecido de solidariedade, alimentado pela desindividualização dos laços de sangue, e estendido ao conjunto da comunidade aristocrática. As uniões serão submetidas à disciplina do Estado segundo as regras da eugenia, enquanto as mulheres (as feministas chegaram atrasadas...), uma vez confiados seus filhos desde tenra idade aos modelos educativos implementados pelas instituições do Estado, poderão reempreender sua participação ativa na vida pública. Trata-se de uma ascese vertical, um volo imperiale, uma superação radical da sufocante amálgama feita de posse e desconfiança, hipocrisias e convenções, que caracterizam as relações interpessoais na podre e infame família burguesa.

"Um dia os trabalhadores viverão como os burgueses, mas por cima deles, mais pobre e mais simples, estará a casta superior. Esta será dona do poder". (2)

É um comunismo aristocrático e ascético, antidemocrático e anti-igualitário, que, por outra parte, não deixará de encontrar uma total ressonância nas prefigurações das sociedades comunistas não-marxistas ou cidades ideais surgidas no período renascentista ou ao redor do cristianismo das origens.

No livro segundo de sua obra principal, "Utopia", Thomas Morus descreve os contornos ideais da república perfeita. É a República de Utopia, na qual está abolida a propriedade privada e o uso dos bens está permitido a cada um segundo suas necessidades. Está suprimido também o uso do dinheiro, porque os bens se estimam por seu valor intrínseco e não como mercadoria de troca; e isso, a fim de evitar processos de acumulação e fenômenos especulativos. O trabalho é um dever social para todos, enquanto que as leis são poucas, simples e de fácil interpretação para todos. Em Utopia cada qual professa livremente a religião que deseja, mas todos admitem a existência de um ser supremo, a imortalidade da alma, o prêmio da virtude e o castigo do vício.

Na Cidade do Sol - notavelmente influenciada pelos modelos políticos de Platão e Thomas Morus - Tommaso de Campanella expressa suas aspirações relativas à política de "renovação dos séculos".

Os solares vivem em uma república - a "Cidade do Sol" - regida por um rei-sacerdote, o "Metafísico", e por três magistrados (Pan, Sir, Mor), isto é, "poder", "sabedoria" e "amor", que simbolizam os três atributos fundamentais do Ser desenvolvidos na "Metaphysica". Os solares praticam uma religião natural e possuem em comum a propriedade e as mulheres, enquanto que a procriação dos filhos está submetida a normas eugênicas. Segundo Campanella, a educação deve basear-se na experiência e em provas seletivas de aptidão, não em livros, do mesmo modo sua concepção política se funda em uma visão ético-religiosa e cósmico-mágica do universo.

No século XVIII, Morelly considera que a propriedade privada havia rompido a harmonia do estado de natureza, de cuja existência histórica Morelly, ao contrário de Rousseau, estava convicto. No estado de natureza reina a mais completa igualdade (com Morelly nos encontramos frente uma teorização comunista que, ainda não sendo marxista, resulta de qualquer modo já igualitária) e a comunidade de bens; a introdução da propriedade privada corrompe os costumes humanos e destrói suas inclinações naturais. O novo estado de natureza - cuja configuração comunista está descrita na Basiliade e no Códice - se caracterizará pela valorização da agricultura e do artesanato, enquanto que leis (anti)suntuárias impedirão a excessiva concentração de riquezas e os efeitos corruptores do luxo.

A influência de Morelly será notável com relação à ala mais radical da revolução francesa e no posterior socialismo utópico.

Charles Fourier acusa filósofos e políticos de adorarem duas perversas instituições da sociedade: o comércio privado e a família. Fundadas ambas na incoerência, quer dizer, sobre a fragmentação da sociedade em pequenos núcleos adversários e concorrentes, assim como sobre a mentira.

O comércio é o câncer da economia na medida em que representa uma atividade parasitária e fraudulenta dirigida a fomentar as condições favoráveis a qualquer atividade e manobra especulativa, do mesmo modo que a anarquia da produção e da circulação, o denominado "livre-comércio", é causa das crises econômicas mundiais.

No que concerne a família burguesa, baseada no egoísmo de casal e no matriarcado, esta pressupõe o crisol da hipocrisia e do convencionalismo, da esterilização das paixões e da miséria dos sentimentos (lógico e vergonhoso epílogo a um humorístico propósito de eternidade [sic] fundado sobre um "sim" dito perante um padre ou prefeito). Permita-nos sublinhar que hoje a família é isto, em um tempo no qual, por causa da "ausência de progenitores", extinguiu-se já qualquer função educativa da família em relação aos filhos, aos quais se transmite unicamente egoísmo, vileza e oportunismo. Não podendo ser outra coisa que uns fracos. A família burguesa? Uma carcaça em putrefação...

Para Fourier, o "trabalho sugestivo" deve se desenvolver dentro de comunidades denominadas "falanstérios", que estarão formados por um número de pessoas não superior a 1.600. Estas deverão desempenhar atividades genericamente relacionadas com o território circundante, ao extremo de se dotar também de uma pequena parte de indústria e de trabalho artesanal. Hostil a toda forma de socialismo igualitário e moralista, Fourier pensava que não era necessário suprimir a propriedade privada e a desigualdade social (a renda de cada associado é proporcional a seu trabalho, a seu talento e ao capital eventualmente investido), mas isto não deveria comportar o retorno de formas de competição e exploração ligadas à propriedade privada burguesa.

O Estado popular deverá constituir o tecido organizativo-institucional que acompanhe à obra de formação do "novo homem", preciosa substância celular do nunca extinto filão áureo da raça ário-europeia. Será necessário laminar e pulverizar os sustentáculos políticos, sociais e econômicos que mantém - qual sólidas plataformas - os processos de reposição das oligarquias burguesas e plutocráticas que dominam os regimes democrático-parlamentares.

Laços de clientelismo - entretecidos de forma implacável e enérgica dentro de uma sociedade na qual o homem brilha por sua ausência e predomina o vaga-lume - atados ao redor das burocracias do Estado, do partido e do sindicato; consolidados status sociais burgueses (porque se bem é certo que a burguesia é antes de tudo uma mentalidade - nisso estamos de acordo - não é apenas isso, dado que ela se expressa simultaneamente também na ostentação do poder e do privilégio particular mediante estratificações sociais muito definidas, concretas e socioeconomicamente caracterizadas); poderosas e determinantes concentrações de riqueza econômico-financeira obtidas de qualquer modo; são as bacterias nas quais e ao redor das quais se educam e nas quais, posteriormente, se espremem para sua engorda dentro das estruturas do Estado democrático os defensores, ou melhor ainda os servos que asseguram a hegemonia social do partido único da burguesia.

Trata-se de massa gregária à qual se faz passar fraudulentamente por classe dirigente, cujo único e muito difuso traço de identidade resulta artificiosamente conferido pela adesão às convenções sociais, aos ditados das modas culturais e a esse domínio da aparência no qual se funda e encontra respaldo e reconhecimento a micromoral utilitarista e os critérios de valoração quantitativos e materialistas do "último homem". E nos referimos aqui ao inseto travestido com máscaras grotescas que, na sociedade burguesa, em meio a esforços inumeráveis, parecem dotá-lo de um semblante mais ou menos humano.

No Estado popular a formação da aristocracia política aflui à margem de qualquer condicionamento econômico ou social proveniente da sociedade civil. A qualidade do homem se valorará pela capacidade de adesão a uma visão do mundo centrada sobre valores éticos e, ali onde se deem as condições espirituais.

A relação burguesia-sociedade, quer dizer a relação existente entre ocupante e espaço de ocupação, será substituída pela relação Estado-Comunidade do Povo, onde o primeiro resulta ser o evocador e a segunda o âmbito ao qual se dirige a chamada do Estado, a qual só uma minoria de eleitos responderá, melhor ainda, poderá responder, a fim de assegurar a reposição necessária, fisiológica, orgânica da aristocracia política do povo.

Integrados nas organizações políticas do Estado, os membros da comunidade, desde a mais tenra infância, estão situados em uma posição de paridade de condições nas quais não falham, em uma palavra não pesam, pré-concebidos status econômico-sociais mais ou menos favoráveis ou posições de privilégio adquiridas por qualquer meio. A impossibilidade técnica - garantida pela regulação comunista, que, não obstante, deverá conjugar-se com o nascimento de um novo tipo humano - de acumular individualmente bens econômicos instrumentais e de consumo, impedem que os membros do Estado popular façam depender sua hierarquia dentro das estruturas estatais da posse de riquezas materiais. Assim, se desenvolverá um processo de diferenciação hierárquica, enraizada na natureza física, intelectual, ética e espiritual (melhor ainda: racial) diferente de cada qual. E não ofensivas desigualdades baseadas na riqueza e na origem social, senão autênticas hierarquias qualitativas fundadas em uma diferente morfologia ontológica.

A organização comunista do Estado popular deverá criar espaços absolutamente livres em relação aos mecanismos e às dinâmicas contratuais e mercantis que caracterizam a sociedade burguesa, ou o que é o mesmo, deverá suscitar os pressupostos técnico-estruturais idôneos a fim de coroar a obra de desintoxicação com a qual o homem será libertado do veneno inoculado pela ética mercantil judaico-burguesa. Resulta imprescindível derrubar os pilares sobre os quais a "era econômica" se consolidou e prosperou, assinalando e destruindo as instituições econômicas e sociais que, objetivamente, constituíram o humus no qual o partido único da burguesia articulou sua ditadura hegemônica.

Um Estado que pretenda realizar sua essência aristocrática e hierárquica com o objetivo de permitir a seus membros o viver uma existência orgânica, não pode prescindir de acometer a soluções radicais que, situando-se mais além do niilismo, derroguem as fórmulas econômicas mercantis: "... deve ficar esterilizado o ambiente do qual o burguês extrai vida: tal é a razão de uma regulação econômica comunista!" (3)

O regime de comunismo de bens terá a missão de eliminar o diafragma econômico e contratual que, com a afirmação burguesa, constitui o único nexo vinculante entre um homem e outro. A supressão das articulações estruturais do capitalismo, uma vez confinada a economia a uma área marginal e inessencial (ergo: instrumental), criará um espaço livre capaz de permitir ao homem assumir e expressar sua real expressão e dimensão ético-espiritual. A inexistência de finalidades individualistas alheias ao Estado, tornará natural e lógica a abolição do regime de titularidade privada dos meios de produção, da riqueza imobiliária e da concentração financeira, elementos e interesses objetivamente estranhos com relação aos fins de Estado.

Não obstante, deve admitir-se que a função desempenhada pela propriedade privada na civilização clássica ou na romano-germânica medieval (4) não foi aquela atribuída nas sociedades burguesas: ou seja, uma entidade econômica e quantitativa objetivo de exploração produtiva, propiciadora de bem-estar material e dinheiro, passaporte que permite trepar na escala dos chamados (sic) "níveis sociais". Por outra parte, não se pode negar que o quadro econômico, caracterizado por uma relação equilibrada entre produção e consumo, não era em absoluto o do atual "demonismo produtivo", senão, ao contrário, apresentava singulares analogias e pontos comuns com que, hoje, poderiam ser atualizados no contexto de uma economia de tipo comunista.

A propriedade privada, salvo para o pensamento liberal-democrático (veja-se Locke), não representou nunca um valor por si mesmo: não teve jamais um crisma de "sacralidade" e de inviolabilidade; não possuiu nunca uma autônoma e intrínseca essência capaz de lhe conferir um valor que a eleve por cima de sua função meramente instrumental. Que fique bem claro: nós niilistas-revolucionários não temos fetiches a adorar, e a propriedade privada não é outra coisa que um dos ídolos do mundo burguês. A propriedade privada é hoje a projeção organizativa e estrutural do fracionalismo individualista-burguês. Para nós, o regime jurídico ao qual se submetem os bens materiais desempenha uma função dependente - por conseguinte: relativa e instrumental - frente à categoria do Político, a qual não admite nem consente a existência de magnitudes absolutas e intocáveis sobre o plano contingente da esfera sócio-econômica.

"Ao princípio se possuía riquezas porque se era poderoso. Agora se é poderoso porque se tem dinheiro. Só o dinheiro eleva o espírito sobre um trono. Democracia significa identidade perfeita entre dinheiro e poder".

Antes propriedade e riqueza expressavam posições de poder qualificadas sob o aspecto de grandeza interior; agora as posições de privilégio são consequência da solidez do patrimônio econômico e financeiro, adquirível mediante os típicos dotes da mentalidade mercantil judaico-burguesa.

Por conseguinte, existia um vínculo orgânico e imaterial entre personalidade e propriedade, entre função desempenhada e riqueza, entre dignidade pessoal e posse de bens. Deste modo, dotando à economia de um sentido que a transcendera, ela era impedida de tornar-se autônoma e se constituir em razão de si mesma, objetivo que esmaga, afoga e extingue toda forma de dignidade, de aspirações e de sensibilidade.

Estas observações deveriam ser suficientes para demonstrar o infundado de possíveis refutações esgrimidas por quem quisera ver na utopia comunista-aristocrática do Estado popular uma torpe imitação dos regimes socialistas, mais ou menos reais, de inspiração marxista.

Mas, por rigor expositivo, resulta interessante deter-se no conceito de comunismo.

Comunismo, na acepção marxista, não é copropriedade, porque esta é um modo de ser da propriedade, assimilável ao conceito de "communio" elaborado pelo direito romano. Só uma pessoa ou uma comunidade de pessoas ou uma entidade que possua um conteúdo ontológico (6) podem ser titulares de uma propriedade.

O Estado socialista que, segundo Lênin, está destinado a terminar "na lixeira da história", não pode ser titular dos bens da nação, posto que não é mais que mera superestrutura, carente de uma essência que pudesse dotá-lo de uma realidade ideal de tipo platônico. Para os marxistas, o Estado é um aparato burocrático-repressivo, um instrumento útil durante uma fase de transição no curso da qual deveria acontecer a passagem do socialismo ao comunismo. Assim pois, na sociedade marxista, a abolição da propriedade privada é em realidade expropriação da propriedade do povo em benefício da oligarquia técnico-burocrática, em cujas mãos se realiza a coincidência entre poder político e poder patrimonial. De fato, a propriedade sem proprietário não existe: a propriedade é do povo ou da oligarquia; a propriedade atribuída a instrumentos ou a fantasmas jurídicos isentos de conteúdo humano ou ontológico (o Estado marxista) é somente uma tela que oculta a exploração do povo por parte do poder oligárquico, que concentra em suas mãos o monopólio discreto dos bens de uma nação.

Nas concepções tradicionais, ao contrário, o Estado é o espaço das formas ideais, dos arquétipos ontológicos pré-existentes e superiores à realidade concreta que foi modelada neles e por eles. O Estado, portanto, "é", não constitui um instrumento senão um centro real de poder que pode, em consequência, ser titular dos bens da nação, dos quais concede a posse aos membros da comunidade do povo, que devem empregá-los de acordo com o bem comum.

A unicidade da Tradição informal (7) se expressa sobre o plano histórico mediante formas tradicionais distintas e múltiplas, que podem apresentar umas frente a outras características aparentemente divergentes. De onde, não se pode excluir a priori que a organização econômica de um ordenamento político inspirado nos valores da Tradição pode se configurar com perfis de tipo comunista.

Uma vez estabelecida a distinção entre o plano do político e o plano do econômico, este último poderá assumir as conotações organizativas mais variadas. A essência espiritual da Tradição não acarreta necessariamente sua manifestação concreta em um marco econômico institucional e organizativamente determinado a priori. Também um marco econômico estruturalmente comunista poderá ser sustentado e alimentado, impregnado e inspirado por valores tradicionais. A vida econômica será caracterizada por relações hierárquicas e solidaristas, pela coincidência entre vocação e profissão, e pela serena consciência de viver uma existência organicamente enlaçada com o Todo e conforme à própria natureza, a qual, por sua vez, permite uma consciente e responsável aportação à consecução dos fins do Estado.

O Estado não é capitalista nem comunista, porque, voltado a vincular-se a um plano de valores transcendentes o espaço econômico, não se identifica nem pode ser reconduzido, condicionado ou definido por uma determinada forma econômica organizada. A diferença qualitativa, ao contrário, deve ser buscada na influência que o princípio econômico exerce em uma sociedade, na autonomia decisiva e operativa e na capacidade de controle que o Estado possui em relação à economia. Não há que buscá-la certamente em diferenças de caráter técnico-organizativos.

"A verdadeira antítese não é pois aquela entre capitalismo e marxismo, senão a existente entre um sistema no qual a economia é soberana, mais além da forma que esta revista, e um sistema no qual fica subordinada a fatores extraeconômicos dentro de uma ordem muito mais vasta e completa, capaz de conferir à vida humana um sentido profundo e de permitir o desenvolvimento de possibilidades mais elevadas que ela".

Não existe conflito entre sistemas econômicos tecnicamente considerados, senão entre as diferenças posições que a economia ocupa em uma sociedade e entre as diversas estruturas internas dos tipos humanos que se situam frente a ela. Resulta pois fictícia a distinção entre diferentes sistemas de produção e distribuição de bens e da riqueza - reduzindo-se esta ao mero domínio organizativo-instrumental - quando o bem-estar das massas resulta o objetivo último em torno ao qual estes sistemas fazem convergir seus esforços.

Rechaçar conscientemente e não epidermicamente o dogma do determinismo marxista, com o qual se pretende modelar o homem e suas plenitudes espirituais, culturais e políticas sobre a base de relações de produção, significa atribuir importância fundamental não à esfera econômica considerada em si mesma, senão à posição ocupada por ela, à influência por ela exercida e à atitude com a qual o indivíduo se coloca frente ao fato econômico.

Em conclusão, consideramos o projeto comunista-aristocrático do Estado popular como um elemento já adquirido dentro do patrimônio cultural tradicional; assim, consideramos positivamente uma elaboração cultural que dote de um ulterior volume teórico a esta solução organizativa.

Não há necessidade de contrapor nenhum tipo de preconceito com relação às formas econômicas que assumirá a futura Restauração tradicional; em seu interior, inclusive o esquema organizativo do Estado popular poderá propor-se como solução funcional.

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(1) - O pensamento marxiano se orienta para a construção de um sistema sócio-econômico baseado na atribuição indiferenciada e igualitária do bem-estar material (bem-estar do qual, na época das especulações de Marx, gozavam só dentro da sociedade burguesa algumas classes sociais) ao conjunto da sociedade civil, na perspectiva da abolição do Estado, da total homogeneização social e da igualdade econômica. Na Suécia, Noruega, Dinamarca, por exemplo, se realizou - em um contexto estruturalmente distinto ao imaginado por Marx - o sonho messiânico da "sociedade sem classes" aspirado pelo intelectual judeu. Nessa sociedade desapareceram praticamente as diferenças sociais ou de classe, enquanto que o desfrute generalizado dos bens materiais ultrapassou amplamente o limite do supérfluo, no âmbito de um sistema social caracterizado pela presença de uma corrupta, obesa e satisfeita (inclusive ainda que o alcoolismo e os suicídios tenham uma incidência destacada) burguesia de massas, ofuscada e embrutecida por um estupefaciente materialismo prático muito mais absorvente socialmente que o chamado "socialismo real". Não existe questão social, enquanto que a religião protestante, longe de ser o "ópio do povo", é o fermento que permite às massas burguesas sublimar no Evangelho a visão mercantil, utilitarista e materialista da vida...poderia Marx desejar algo melhor?

(2) - Friedrich Nietzsche, Vontade de Poder

(3) - F.G. Freda, "A Desintegração do Sistema". O ambiente é o conjunto das condições físicas, químicas, biológicas nas quais se desenvolve a vida de uma comunidade de organismos. Na sociedade democrática, o ambiente é o conjunto das condições ou circunstâncias institucionais e estruturais, dos mecanismos econômicos e sociais que permitem ao burguês atuar em coerência com a própria mentalidade mercantil. Bancos e indústrias privadas, contratos e usura, livre iniciativa econômica e propriedade privada, representam os veículos jurídico-institucionais estrutural e funcionalmente adequados para a expansão infecciosa e a realização operativa da mentalidade burguês-capitalista. A supressão destas instituições econômicas e destas fórmulas jurídicas determinará o desarme material do burguês, privando-o do suporte instrumental idôneo para ativar suas potencialidades mercantis. Trata-se, definitivamente, da esterilização do ambiente, ao qual, não obstante, se deverá acrescentar organicamente uma eficaz terapia destinada a apagar a mentalidade burguesa, favorecendo, ao mesmo tempo, o nascimento e a afirmação do "homem novo".

(4) - Entre os antigos germânicos, assim como na civilização clássica e na romano-germânica medieval, a propriedade - empapada por valores espirituais, religioso e éticos e organicamente integrada no tecido social - concorre funcionalmente à conservação do equilíbrio econômico da comunidade do povo. A Sippe (correspondente à gens romana) dos antigos germânicos, conhecidos e descritos por Tácito em seu De Origine, situ, moribus et populis Germaniae, reúne em um contexto de relações sociais de tipo solidarista a um grupo orgânico de famílias descendentes de antepassados comuns de estirpe divina. No interior da Sippe o indivíduo não existe como subjetividade particularista de direito, senão que a própria identidade individual está radicada no grupo do qual forma parte orgânica integrante. Os membros do grupo gentílico cultivam as parcelas de terra circundantes, que não constituem uma propriedade individual senão pertencem solidariamente, como por outra parte os bosques e pastos, à Sippe. Fustel de Coulanges (A Cidade Antiga) escreve: "Conhecemos o direito romano da época das XII Tábuas; está claro que nessa época a alienação da propriedade estava permitida. Mas existem razões que nos levam a pensar que, no que concerne à época originária da Romanidade, a terra estivera submetida a um regime jurídico de inalienabilidade". O proprietário de um bem imóvel não é nunca um particular, mas uma família ou uma estirpe: "O indivíduo - escreve De Coulanges - recebe a terra somente em posse: pois de fato pertence também àqueles que morreram e aos que nascerão". No medievo romano-germânico o regime da propriedade está fundado sobre o benefício, que é a concessão de um determinado território por parte do senhor feudal ou do soberano a um vassalo a ele subordinado, no marco de uma ordem hierárquica piramidal de conteúdo ético e espiritual. Esta concessão não comporta direitos de propriedade senão somente o usufruto do bem (terra e castelos). Por sua vez, o vassalo - à margem de prover determinadas contribuições de caráter econômico (produtos da terra, etc.) - jura fidelidade pessoal a seu senhor pelo qual se compromete a combater em caso de guerra.

(5) - Oswald Spengler, "A Decadência do Ocidente"

(6) - "Ontologia" é um conceito introduzido no vocabulário filosófico a partir do século XVIII para assinalar a "ciência do ser", obrigação que Aristóteles atribui à filosofia primeira ou metafísica. A expressão "conteúdo ontológico" pode ser referida a uma entidade que "é" enquanto objeto de estudo por parte da "ontologia". A essência - por conseguinte: a realidade - pode constituir o fundamento da titularidade de um bem econômico. A propriedade de um bem não é, portanto, prerrogativa exclusiva de uma pessoa física ou de uma comunidade de pessoas, senão que pode ser atribuída a qualquer entidade que - mais além - da fictio iuris da pessoa jurídica (sic!) - tenha uma essência e, por isso, "conteúdo ontológico".

(7) - A Tradição informal, cujo plano se situa em uma dimensão cósmica transcendente, está constituída por uma única essência; esta se manifesta, desenvolve e atualiza sobre o plano histórico no marco de formas tradicionais organicamente diferenciadas, e, em consequência, adequadas à mentalidade e às disposições espirituais da comunidade na qual se desenvolve. A Tradição informal é o Princípio metafísico imanifesto ou totalidade da Possibilidade Universal. A manifestação do princípio metafísico implica em um processo de determinação no contexto de uma forma espacial, temporal e historicamente delimitada. A Tradição informal se diferencia e formaliza em seu modo de expressão, mas é única em sua essência transcendente.

(8) - Julius Evola, "Os Homens e as Ruínas"