18/12/2016

Christophe Geffroy - Entrevista com Alain de Benoist: A Bênção dos Limites



Nós tivemos a alegria de entrevistar os maiores intelectuais franceses, de Chantal Delsol a Pierre Manent, passando por Marcel Gauchet, Alain Finkelkraut, Jacques Juillard, e alguns outros, em nossas colunas. Alain de Benoist não é cristão e, portanto, divergimos em alguns pontos, mas ele é uma grande mente aberta ao debate e com a qual as concordâncias abundam. Enquanto ele permanece majoritariamente ostracizado na "mídia de massa", nós estamos felizes e honrados e dar espaço aqui.

P: Você é um dos fundadores da "Nouvelle Droite", do GRECE, e muitas publicações desse movimento. Você poderia recordar as circunstâncias desses desenvolvimentos e as principais ideias que você, assim, defende?


R: O que foi designado muito mais tarde pela extremamente medíocre expressão "Nouvelle Droite" [Nova Direita] nasceu em 1967-1968, um pouco antes dos eventos em Paris durante o mês de maio. Adolescente, eu havia tido uma experiência de militância política intensa, praticamente total nos quatro ou cinco anos precedentes, dentro da direita radical (a Fédération des étudiants nationalistes de François d'Orcival, então o movimento do periódico Europa Ação, fundado por Dominique Venner). Uma escola dura e uma experiência memorável, mas cujos limites eu rapidamente testei. Aos 25 anos de idade, eu entendi que eu era um homem do saber, não um homem do poder, para falar como Raymond Abellio. Ademais, eu estava cansado dos slogans e das ideias prontas. Então eu rompi definitivamente tanto com a ação política quanto com a extrema-direita, para me devotar completamente ao trabalho do pensamento. É então que eu criei o periódico Nouvelle École, pouco antes de lançar o GRECE. O periódico Éléments apareceu em 1972. Eu também publiquei o periódico Krisis em 1988, que foi criado para ser um "periódico de ideias e debates". Essas três publicações ainda são publicadas hoje. Minha intenção à época era começar do zero, quer dizer inventariar sistematicamente todos os domínios do conhecimento de modo a levar ao desenvolvimento de uma nova cosmovisão capaz de esclarecer o momento histórico em que vivemos. Eu tinha em mente o exemplo da Escola de Frankfurt, da Action Française e do CNRS! Obviamente, eu tive que dar alguns passos para trás. No mínimo posso dizer que desde meio século atrás, eu jamais estabeleci outros objetivos.


P: Você colaborou com a Revista Figaro no fim da década de 70: você alcançou notoriedade ali, mas você foi expulso. Isso já havia sido por "crimepensar", e podemos ver neste episódio o início do ostracismo midiático do qual você tem sido vítima?


R: As coisas são mais simples. Louis Pauwels, quando criou a Revista Figaro, me pediu para ajudá-lo, o que aceitei. Muitos de meus amigos também participaram nessa aventura. Três anos depois, traumatizado pela chegada da esquerda ao poder, Pauwels decidiu se convertar ao cristianismo e ao liberalismo, ainda antes ele não fosse nem cristão, nem liberal. O Monsenhor Lustiger recebeu sua confissão. Seguindo seu exemplo, teria sido fácil para mim preservar minha posição na revista. Eu não o fiz. A expulsão da qual você fala foi a consequência lógica. Mas eu não penso que este tenha sido a origem do ostracismo que você também mencionou. Este é apenas um aspecto da evolução mais geral da paisagem intelectual, que tem progressivamente marginalizado uma série de livres-pensadores e que atingiu muitos outros intelectuais além de mim. Isso é algo que está começando a passar hoje. A geleira intelectual está em processo de derretimento. Aquecimento global!


P: Eles o criticaram por defender teorias "racistas" à época: o que era, na verdade, e você mudou? Não seriam essas acusações antigas que se mantém presas a você?


R: Os pequenos perseguidores que querem ditar a mídia hoje lançam mão de muitos meios! Os fantasmas "racialistas" eram parte da bagagem de juventude que eu há muito deixei de lado. Eu publiquei três livros contra o racismo, nos quais eu desconstruí metodicamente teorias racistas de modo a demonstrar sua falsidade intrínseca. Eu fiz o mesmo com todas as doutrinas que pretendem derivar a especificidade sócio-histórica das sociedades humanas exclusivamente da biologia. E quanto eu falo em identidade, é a Martin Buber que faço referência, não a Gobineau! É suficiente me ler para perceber isso (não há falta de material: 102 livros, 2.000 artigos, 600 entrevistas). Mas eu não sou mais tão inocente: ao contrário, eu sei bem que o objetivo verdadeiro é impedir que as pessoas me leiam.


P: Em relação ao início da "Nouvelle Droite", quais são os principais pontos que você acredita terem mudado e quais são os temas persistentes, fundamentais?


R: Mais que mudanças, houve inflexões. Por exemplo, hoje eu não mais subscreveria à rejeição completa do pensamento de Freud ou de Marx à qual eu aderia nos anos 70. Além dos grandes polos de influência que deixaram sua marca em mim bem cedo, como o pensamento socialista do início do movimento sindicalista (Sorel, Proudhon, Leroux, Malon), os "inconformistas" da década de 30 (Mounier, Robert Aron, Alexandre Marc), ou a Revolução Conservadora alemã (Schmitt, Spengler, Jünger, Moeller van den Bruck), meu interesse se voltou cada vez mais para as ciências sociais, de Max Weber a Jean-Claude Michéa, passando por Simmel, Sombart, Baudrillard e Louis Dumont. Mas eu também segui com minhas obras sobre tradições populares e a história das religiões.


P: Como você analisa a emergência do "politicamente correto", com seu vetor principal de antirracismo, e a pouca resistência que ele enfrenta?


R: Ele é originalmente um modismo que veio dos EUA. Na França, ele floresceu na esquerda, mas também marcou o fim de uma esquerda fiel a suas aspirações iniciais. Ao privilegiar o antirracismo e a "luta contra toda discriminação", a esquerda buscou um sujeito histórico substituto, porque ela deliberadamente se separou do povo. Ao recitar os mantras dos direitos humanos e reivindicar a defesa de toda forma de desejo, inclusive a nível institucional, ela quer ocultar sua vergonhosa adesão ao monoteísmo de mercado. Este virada encontrou pouca resistência porque o terreno havia sido preparado, por pelo menos dois séculos, pelo que eu chamei de a ideologia do "Mesmo", essa ideologia multifacetada que nos diz que os homens são fundamentalmente os mesmos em todo lugar e que as diferenças que notamos entre eles são secundárias, ou mesmo danosas. A igualdade, nessa perspectiva, se torna um sinônimo de mesmidade.


P: Você tem escrito bastante sobre liberalismo. Enquanto nosso país sofre com um paralisante socialismo estatal, enquanto violência islâmica se espalha em casa com a imigração em massa, enquanto eles "desconstroem" o homem passo a passo da teoria de gênero ao trans-humanismo, em resumo, enquanto muitas ameaças concretas nos sobrepujam, por que o liberalismo também é um perigo nesse contexto?


R: As ameaças mais barulhentas e visíveis não são necessariamente as mais importantes. Algumas são tão formidáveis quanto silenciosas, como o poder crescente da inteligência artificial ou a convergência de NBIC (nanotecnologias, biotecnologias, informação e ciências cognitivas) na fabricação e transformação da vida. Se eu privilegio a crítica do liberalismo, é porque ele hoje representa a ideologia dominante na maioria dos países do planeta, mas também porque ele está na origem da maioria dos males que você menciona. O trans-humanismo e a ideologia de gênero se sustentam na ideia de que o homem pode criar a si mesmo a partir do nada, que se conforma perfeitamente à antropologia liberal, que não vê o homem como herdeiro, mas como um ente autorizado a sempre buscar seu interesse de maneira egoísta e cujas escolhas jamais se enraizam em algo que o precede. Desde o começo, a imigração representa o "exército de reserva" dos empregadores: os liberais sempre foram partidários da livre circulação de pessoas, bens e capital. Em face das patologias sociais resultantes, eles não tem nada a oferecer além da criação de um "mercado de imigração" (já que eles também querem criar um mercado baseado no direito de poluir!). Quanto a violência islamista, ela é apenas o resultado convulsivo das guerras "humanitárias" lançadas no Oriente Médio pelas potências ocidentais dominadas pelo universalismo dos direitos humanos e pela obsessão pelo mercado.


P: Segundo você, os problemas que eu acabei de mencionar delineam novas divisões políticas, e se sim, quais?

R: Nascida da modernidade, a divisão esquerda/direita decai com a modernidade. Apenas aqueles que ainda se apegam a ela não entenderam que o mundo mudou, e que instrumentos conceituais obsoletos não permitem análises. A única divisão verdadeira hoje é a que contrasta a França periférica com a França urbanizada, o povo com as elites globalizadas, as pessoas comuns com a classe governante, as classes populares com a grande burguesia globalista, os perdedores com os vencedores da globalização, os defensores das fronteiras com os parditários da "abertura", os "invisíveis" com os "sobrerrepresentados", em resumo os que estão no fundo e os que estão no topo. Sobre este ponto eu os remeto às obras de Christopher Lasch e Christophe Guilluy. É apenas nessa perspectiva que podemos compreender um fenômeno como a ascensão do populismo, que constitui a única real novidade política dos últimos 30 anos.

P: Você acha que estes problemas podem encontrar soluções no esquema do debate eleitoral, e assim se aproximar a uma resolução após uma "boa" eleição?

R: Eu não acredito muito em "boas" eleições, nem que o partido político enquanto forma ainda tenha muito futuro. Sob as circunstâncias atuais, as eleições permitem alternância, mas não alternativas: elas permanecem no mesmo paradigma social. Toda a questão é saber como podemos mudá-lo. Mesmo se vivemos na época de implosões, ao invés de explosões, meu sentimento é de que só mudaremos a sociedade quando se tornar impossível não mudá-la. É outra maneira de considerar o fim do capitalismo que desejamos. Eu escrevi isso muitas vezes: o sistema monetário perecerá pelo dinheiro.

P: O que combate cultural significa para você, e como você o situa em relação a ação política?

R: A cultura geral desapareceu na escola; a classe política hoje consiste fundamentalmente de pessoas educadas, mas incultas, como disse Alain Finkelkraut. Ademais, os partidos políticos sempre desconfiaram de ideias, que inutilmente dividem as pessoas aos seus olhos. Quanto a direita, ela nunca gostou muito de intelectuais. O trabalho cultural, que objetiva mudar o espírito dos tempos, deve portanto seguir outros canais.

P: Os EUA terão um novo presidente neste outono. Você acha que isso mudará algo concretamente em termos de equilíbrio mundial?

R: Os EUA entraram em uma fase de relativo declínio, mas permanecem uma potência que não deveríamos subestimar. Com Hillary Clinton, que é a representante dos meios empresariais e do sistema, o principal risco é o de um relançamento da Guerra Fria, ou mesmo da guerra, ponto. O capital sempre demandou guerra quando não há outros meios de relançar a corrida pelo lucro! Donald Trump representa o desconhecido. No mínimo, estaria de acordo com o princípio da precaução lembrar que, se a Europa sempre teve muitos governos pró-americanos, nunca houve um governo pró-europeu nos EUA.

P: Você se define como "pagão": Para você, o que é ser pagão? O que estabelece sua antropologia?

R: Como resumir em poucas frases, e ademais em uma publicação católica, uma posição sobre a qual eu já escrevi milhares de páginas? A oposição entre cristãos e pagãos claramente não pode ser reduzida ao número de deuses. O paganismo é, fundamentalmente, uma religião da pólis (os gregos adoram deuses gregos). Ele é, então, uma religião do cosmo e da vida, onde ética e estética jamais entram em oposição. O paganismo é a ética da honra, não a moralidade do pecado. É a condenação do excesso (hybris), o senso de limites, a negação da primazia a tudo que é meramente material. Historicamente, o cristianismo é um fenômeno híbrido que teve que disputar com as formas do paganismo sem cessar de combatê-lo em essência. É essa complexidade que eu tentei revelar em Comment peut-on être paien? [Como se pode ser pagão?] (1981), e talvez ainda mais em meu diálogo com o filósofo cristão Thomas Molnar em L'éclipse du sacré [O Eclipse do Sagrado] (1986).

Eu não gosto daqueles que não crêem em nada. Eu acredito que para que se possa dar o melhor de si, para que se possa alcançar o próprio telos, o homem deve apelar a algo que o ultrapassa. Mas eu não creio em qualquer "pós-mundo", em qualquer além-mundo. Eu não creio na distinção teológica entre ser criado e ser não-criado. É por isso que eu me sinto mais em casa submergindo nos épicos homéricos ou na Canção dos Nibelungos, praticando Heráclito, Aristóteles, Sêneca ou Marco Aurélio, do que lendo Sâo Paulo ou Santo Agostinho. Eu estudei as origens do cristianismo por mais de 40 anos. Não vejo nada de crível ou atrativo ali. Eu reprovo o universalismo do cristianismo (o "povo de Deus" não corresponde a qualquer povo), que o impede, quando deixado por conta própria, de assumir uma dimensão identitária. Eu o reprovo por ter introduzido o universalismo individualista no espaço mental europeu, por ter esvaziado o mundo de toda sua sacralidade intrínseca, por ter propagado uma concepção vetorial e linear da história a partir da qual todos os historicismos modernos surgiram, e por ter disseminado essas "verdades cristãs tornadas loucas" (Chesterton) as quais, uma vez secularizadas, se tornam o pedestal do mundo desencantado, esvaziado de sentido, em que vivemos hoje.

Ao mesmo tempo, se você ler minhas memórias (Mémoire vive), que foram publicadas 4 anos atrás, você sabe o que eu devo a autores como Charles Péguy e Georges Bernanos [autores católicos]. Eu também me recordo calorosamente de Gustave Thibon e Jean-Marie Paupert, com quem eu mantive relações bastante afetuosas, que eram correspondidas ao que parece (foi no La Nef, em outubro de 2003, que Paupert teve a gentileza de se referir a mim como seu "alter ego"!). Eu acrescento que não sou um daqueles que não gosta da encíclica Laudato sí, e que o "ecossocialismo" do Papa Francisco me agrada bastante. Sobre a condenação do dinheiro, este "pasto do diabo"; a rejeição da ganância e da crematística; a proteção dos ecossistemas; e a condenação da "comercialização" da vida (que os católicos costumam esquecer que principia com a venda da força-trabalho), pode indubitavelmente haver concordância. Discussões religiosas são discussões intermináveis. Mesmo os crentes são ateus na religião dos outros! A simples experiência humana me mostrou por um longo tempo que entre cristãos, pagãos, ateus ou agnósticos há a mesma proporção de homens bons e espíritos livres, bem como de sectários medíocres e verdadeiros canalhas. Ideias são uma coisa, homens são outra. Eu julgo os homens fundamentalmente com base no que eles valorizam (ou parecem valorizar aos meus olhos), não no que eles dizem. É o que me distingue tanto das santas víboras, os defensores do "politicamente correto", e dos inquisidores do momento.

P: Que temas importantes dirigem seu pensamento político ou filosófico hoje, e quais são os principais perigos que nos ameaçam aos seus olhos?

R: Os perigos são de todo tipo, já que nunca vivemos em um mundo tão incerto. Entre aqueles que eu considero mais preocupantes: a ilimitação global do comércio, o desaparecimento de culturas populares e modos de vida enraizados, a possível substituição do homem pela máquina, a exaustão de grandes projetos coletivos, a ascensão do tecnomorfismo, e muitas outras. Estes são alguns dos temas sobre os quais eu reflito. Mas eu também trabalho sobre temas tão diferentes quanto a importância decrescente do político ou as realizações da exegese contemporânea. É difícil fazer tudo junto!